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Residências Compartilhadas: uma resposta urgente para o futuro das pessoas com deficiência

Quando falamos em pessoas com deficiência no Brasil, inevitavelmente tocamos em uma ferida social: a ausência de políticas públicas capazes de garantir cuidado contínuo e dignidade ao longo da vida. De acordo com o IBGE (2022), mais de 14,4 milhões de brasileiros vivem com algum tipo de deficiência, e mais da metade depende de cuidados permanentes – quase sempre assumidos por familiares, em sua maioria, mães.

Eu mesma, como mãe atípica de três filhos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), vivo essa realidade diariamente. E carrego comigo uma angústia que é compartilhada por milhares de outras mães: quem vai segurar a mão dos nossos filhos quando não estivermos mais aqui?

É a partir dessa inquietação que nasceu a proposta das Residências Compartilhadas, um modelo que busca oferecer não apenas um teto, mas um lar adaptado, humanizado e gerido por quem mais entende de cuidado: mães atípicas.

Um lar que permanece
Diferente das instituições asilares ou hospitalares, onde a alta rotatividade de profissionais mina vínculos afetivos, as Residências Compartilhadas são planejadas para criar continuidade. Nessas casas, mães atípicas vivem e trabalham, cuidando de pessoas com deficiência órfãs de seus cuidadores, ao mesmo tempo em que acolhem seus próprios filhos. Quando uma mãe não puder mais estar presente, seu filho segue cuidado por outras mães da residência, formando uma rede solidária e intergeracional.

Esse é o grande diferencial: ninguém fica desamparado. Nem a pessoa com deficiência, nem os filhos das cuidadoras. Criamos um sistema de pertencimento, de família ampliada, que não expulsa, não abandona, não troca.

Experiências que inspiram
O mundo já nos mostra caminhos. No Reino Unido, Estados Unidos, Austrália e Canadá, formatos como Supported Living e Shared Living oferecem moradias adaptadas com apoio contínuo. Na Europa, comunidades como as Camphill integram pessoas com e sem deficiência em espaços comunitários.

No Brasil, a Política Nacional de Assistência Social prevê as chamadas Residências Inclusivas. Mas ainda são poucas, com problemas de gestão e alcance. Nossa proposta vai além: une infraestrutura adaptada, cuidado permanente e a experiência real de mães que sabem, na prática, o que significa estar no front do cuidado.

Impacto social e econômico
As Residências Compartilhadas também respondem a outra necessidade urgente: a autonomia financeira das mães atípicas. Muitas de nós estamos fora do mercado de trabalho, dedicadas integralmente ao cuidado dos filhos. Esse modelo cria postos de trabalho e reconhecimento, transformando a experiência da maternidade atípica em valor social e econômico.

Além disso, abre espaço para parcerias com o poder público e a iniciativa privada. Empresas alinhadas a práticas ESG podem investir em residências como essas, gerando impacto social mensurável, inclusão efetiva e fortalecimento da economia local.

Uma resposta concreta
Quando penso no futuro dos meus filhos, não imagino apenas inclusão escolar ou oportunidades de trabalho. Penso no básico: quem vai estar ao lado deles quando eu não puder mais?

As Residências Compartilhadas são a resposta possível, urgente e necessária. Mais do que um projeto, é um pacto de dignidade. Uma proposta que pode e deve se transformar em política pública nacional, mas que também pode começar agora, com parcerias, engajamento e coragem.

O que está em jogo não é apenas cuidado – é a garantia de vida plena, autonomia e pertencimento. E isso, como mãe e como cidadã, eu não aceito que seja adiado.